Paula Maria é escritora, psicóloga e artista visual, investiga a poesia em todos estes fazeres. Publicou Primeiros Pedaços (Ed. Pedregulho, 2022) e Caminhos curtos para caracóis (Ed. Urutau, 2023). Em 2022, foi finalista do Prêmio Off Flip de Literatura na categoria Poesia.
medidas de tempo
átimo
instante
logo mais
ainda agora
rapidinho
pisquei e perdi
demorado
atraso
um flash
num pé e volta noutro
nem molhou o bico
comer mangas
as garras do bicho
cravada entre as pernas
afundadas na carne
das coxas
ocre sangue jasmim
os olhos atentos
alarmados
presentes
espiando o futuro
que vira a esquina do tempo
logo ali, mais tarde
é tempo de comer,
– agora
não haverá tantos amanhãs
tens fome e não sabes pedir
arranca de quem tem
apenas de quem tem mais
respira a fuça suada
não larga porém
as coxas trementes
metal ferro brilhos
abertura do tempo
janelas ou portas
quase lá, veja bem
os olhos entreabertos
medo e curiosidade
ao bater a meia noite
afrouxa, recolhe as garras
descansar
talvez amanhã
talvez nunca mais.
sintaxe
segundo a árvore linguística
não podemos dizer
pedra come maçã
isso cunhou chomsky
um homem
também foi outro que disse
eva comeu a maçã
muitos outros homens
vieram desde então
e nenhum ousou dizer
a maçã comeu a eva
ou que a maçã não quis
– o homem
não só porque
não se pode na árvore linguística
é que os homens
de nada sabem da poesia
só sabem de pedra.
cidade alerta
todo lugar pode ter sido
cenário para um crime
ou o melhor dia da vida de alguém
todo lugar esconde alguma coisa visível
penso nisso enquanto cato cacos de espelho
na calçada quente enquanto espero o ônibus
e rezo para não ser assaltada
estou sozinha
esse sempre é o cenário ideal
para um crime
ou pro melhor dia da minha vida.
o som dos pássaros
quando acaba de chover
anunciam:
eu caçarei aquilo que não tem nome